Tudo começa com o mecânico gesto de desligar o aviso sonoro do telemóvel. São horas de mais dia. Segue o assentar dos pés no chão, a constatação de que se respira, e os lembretes para fugir de vícios que matam. Um copo de água e todas as rotinas da higiene. O relembrar dos temas importantes do dia, o olhar baixo porque falta algo, o conforto da água quente na pele e mente secas. A vida a rodar, um fiar constante e igual, a realidade que se vive como se fosse outra dimensão, o déjà vu de quem não vive.
O triste constatar, estás vivo mas não vives. A vontade de chorar, o aperto no peito. A redundância de tudo. Aqui chegaste, respiras apenas, uma vida cheia de nada, vazia de tudo. Flash rápido. É tudo um truque do teu cérebro. Não, é oficial, respiras mas estás morto. Pior que veres a cru a normalidade da tua vida, é a dor de nada fazeres. Ó dia, foge, deita-te na noite, vai. E choras, só, ao espelho do carro, onde passa o nada dos anos para trás.
Os poetas estão mortos. Sim, já ninguém os lê. Ler? Ninguém lê ó estúpido, é tudo imagem, em barda, muita e feroz. Os olhos abertos que nada vêem. Cegos pelo excesso, abertos a todo o inútil. Os poetas estão mortos.
Ninguém te ama como eu.
Ninguém te ama como eu.
Finalmente a amiga noite. Dorme. Não tarda o gesto mecânico. Outro dia igual, para ti morto que respiras e cego de olhos abertos.
No final a maioria acha que viveu.
Deixar de ser normal, para ser feliz?
Ah, quando a noite chega, e o frenesim que anestesia a mente se escoa, a realidade senta-se ao lado, pesada, trazendo desconforto. "A maioria pensa que vive... " Pensa? Ou embebeda-se na ilusão de que vive, mantendo-se acordada, ligada a sem fios, continuando um teatro, em sessão ininterrupta? A maioria, sucumbirá, no dia em que permitir dormir com a realidade.
ResponderEliminarPosso dizer-lhe um segredo? Há quem leia sim, indiferente a modas - Há até quem faça da música companhia - e se, para se ser feliz é preciso enlouquecer, Bendita loucura :-))
Boa noite
É muito mau quando tudo o que gira à nossa volta não nos diz nada. Restam as letras, a música e as artes para nós balizarem no mundo dito normal.
EliminarBoa noite NN
Provavelmente, não diz nada, porque nada tem a dizer, é demasiado oco, fútil, e ainda há gente que não se contenta com isso, mais a imagem, mais o instagram, mais o face, mais as "conversas" da treta. Não são eles que são normais, podem ser a maioria, mas só isso. Mau, mesmo muito mau, é quando não conseguimos ser a nossa melhor companhia. Mau, muito mau, é quando abrimos mão dos nossos valores, para seguir modas de carneirinho.
EliminarAtão qué lá isso!!! Bora lá fazer palavras cruzads :-))
“Deixar de ser normal, para ser feliz?”
ResponderEliminarNão queiras ser normal.
Não queiras ser actor numa feira de vaidades, não queiras ser o palhaço do circo que faz rir a plateia dos estúpidos. Não queiras ser o animal enjaulado, aprisionado, ignorante da sensibilidade, que desconhece o que é a inteligência, o decoro, os mais básicos valores da dignidade, da honestidade, incluindo a intelectual.
Impera o fútil, o faz de conta, a banalidade, a grosseria, a vacuidade, que nem sequer é o nada, é uma vacuidade cheia do muito do mais abjecto e repugnante.
Não queiras ser normal.
Não queiras arrogantemente opinar sobre o que não sabes, fazer julgamentos cruéis sobre o que desconheces, decapitar reiteradamente e sem qualquer pudor a língua de Camões.
Tu não és normal! Não queiras ser normal, porque nem sequer conseguirias ser normal.
E os normais não são felizes. Fingem uma felicidade que não os habita.
A infelicidade, essa sim, imensa, para os que não são normais, seria a não existência dos poetas, a morte dos poetas. Os poetas não morrem, nunca morrem. Vivem na eternidade de todo o sempre. Mesmo que os poetas todos quisessem morrer, os não normais, nunca o permitiriam. E não o permitiram porque deles necessitam, é alimento básico, imprescindível, para a Alma daqueles que têm fome. Fome do sonho, da beleza, do poético, do estético, dos suspiros e murmúrios que provêm do fundo das entranhas das Almas dos poetas.
Sabes, querido Miguel, eu já te contei isto, mas vou repetir.
Vivi até aos meus 10 anos numa pequena vila do país. Não havia livrarias. As cidades onde se podiam comprar livros ficavam a muitos kms, estradas perigosas. Fui sempre pela mão da minha mãe, orgulhosa do meu precioso e pequeno cartão, às visitas regulares que a carrinha da Gulbenkian fazia. Era a leitora mais jovem, mais pequenina…ainda hoje sinto o cheiro desse espaço povoado de livros.
Muito grata estou ao Sr. Calouste Gulbenkian. A ele devo o meu melhor vício. Abençoado vício! O que teria sido de mim sem ele…
Pois é…meu caro, eu também não sou normal, não quero ser normal!
Quero continuar a ser o “Ser” estranho, talvez antigo, que já passei de moda, mesmo que não consiga a felicidade falsa dos normais.
Vivam os poetas!
Vivam os escritores!
Vivam todos aqueles que amam as letras, as palavras, a literatura, a arte!
Não, os poetas não estão mortos, porque são imortais!
Um beijo em ti…poeta…
PS. Desculpa ter escrito tanto, mas…tu sabes…
Que belo desabafo Paula.
EliminarA menina escreve onde? Gostaria de ler mais!
Essa foto é Vettriano? ;)
Beijo. Quero ler mais, combinado?
Miguel, venho agradecer-te a extrema gentileza da tua resposta ao meu comentário/desabafo. Sim, chamaste-lhe bem...desabafo.
EliminarMuito obrigada por teres apreciado e pelo estímulo a que eu compartilhe os meus sentires.
Fica combinado, sim. Uma dia destes, só não prometo quando.
Beijo.
Sim, é JV, tu há muito sabes que sim. E eu também há muito sei que tu sabes (sorriso)
Há quem teime em viver ou em achar que vive ainda que os dias sejam mecánicos e as noites reconfortantes, há quem leia, há quem escreva, há quem seja poeta e esteja vivo. Boa noite :)
ResponderEliminarO mundo é tão grande e não chega. O enjoo da repetição torna-o pequeno.
EliminarBoa noite GM ;)
O mundo é pequeno Miguel, pelo menos o de alguns de nós. O meu tem dias que não passa de uma pequeníssima bolha de onde não consigo sair, mas depois consigo furã.la e sair...
EliminarVoltei e trouxe companhia :-))
ResponderEliminarhttps://metamorphosis-mussitografias.blogspot.pt/2014/04/435-sozinho_73.html
Há uma solidão boa NN, e que não dispenso. :)
EliminarFaço um esforço para tentar chegar ao "normal" de que fala, talvez por defeito profissional sei quanto de anormal se esconde no aparentemente normal. Prefiro pensar que às vezes nos sentimos sozinhos, sem elos e, portanto, desligados do mundo em que a maioria parece encaixar-se. Ou se quiser, é a sensação de viver com um pé dentro e outro fora, às vezes até dá para caminhar bem assim, outras não.
ResponderEliminar~CC~
Tal e qual isso CC :)
EliminarNada é fácil.
EliminarConheço tão bem essa sensação, é como ser espectador da própria vida, estrangeiro na própria casa...
ResponderEliminarÉ muito isso Vi.
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